domingo, 23 de outubro de 2016

A nação petista deve invadir o estado petista



Quero conversar com os petistas de todo o Brasil e especialmente com a sociedade brasileira a respeito do PT.

O PT – este partido do qual sou fundador, desde a reunião no Colégio Sion, quando não passava de um sonho – se tornou real, teve a capacidade de existir nacionalmente, ao contrário da maioria dos partidos no Brasil, sempre feita de federações onde em cada estado era um partido diferente.

O PT foi o primeiro partido a existir de norte a sul, de leste a oeste, com uma filosofia, uma mesma orientação e com diretrizes para o Brasil inteiro, seja no interior do Maranhão ou nos rincões do Rio Grande do Sul.

Nosso grande sonho era chegar à Presidência da República, porque sabíamos que no dia em que chegássemos lá faríamos as transformações necessárias. Sofremos ataques cruéis, fomos sempre acusados de tudo.

Sempre que o PT passa por uma crise há quem decrete o fim do partido. O que mais me entristece, no entanto, é ver petistas falando isso.

Devemos ter consciência de que nossa história é uma história de luta. Uma história bonita.

Me lembro das primeiras prefeituras que conquistamos: Santa Quitéria, no Maranhão, e Diadema, em São Paulo, com o Gilson, metalúrgico. Transformamos Diadema efetivamente.

Depois conquistamos capitais com a eleição de Maria Luiza, em Fortaleza, Victor Buaiz, em Vitória. Maria Luzia, que era da chamada esquerda do PT, sofreu muito com as artimanhas da Direita no Ceará, que pegava caminhões de lixo e jogava nas praças para colocar a culpa nela. Me lembro do Lula se deslocando para lá e pegando num rodo para ajudá-la na limpeza da cidade.

Depois elegemos os dois primeiros governadores: Cristovam Buarque, em Brasília, e Victor Buaiz, no Espírito Santo. Com Cristovam tivemos toda a paciência do mundo. Quantas vezes os petistas aqui quiseram rachar com ele? Para a nossa felicidade tínhamos Cristovam governador e Arlete Sampaio, uma companheira de esquerda, na vice governadoria.

O PT ameaçou várias vezes rachar com o governo, denunciar o Cristovam. Eu nessa época era presidente do PT e sei o que tive de suportar de intolerância.

Conseguimos, no entanto, apresentar projetos interessantes: Bolsa Escola, que virou o Bolsa Família; o projeto parar o carro na faixa de trânsito para o pedestre passar, que se transformou em norma para o Brasil todo após ter sido lançado em Brasília. Implantamos o Saúde em Casa, baseado num programa que tem em Cuba e outros países.

Oferecemos cidadania e resultados importantes e fomos referência para o Brasil e o Mundo, mesmo sofrendo todo tipo de boicote por parte do FHC presidente, mesmo o Cristovam intelectual sendo amigo do FHC intelectual.  Luta de classe é luta de classe. Era necessário derrotar o PT e pra isso ele não facilitou em nada a vida de seu amigo.

Portanto, o PT teve muitas experiências em seus quadros com gente de esquerda, gente de centro, gente que fez boas gestões, outros nem tanto. Superamos todas as dificuldades desses momentos.

Me lembro da prefeita de Belém, depois governadora, Ana Júlia, da corrente de esquerda do PT, Democracia Socialista, que sofreu com muitas brigas internas permanentes; de uma articulação de esquerda que elegeu o prefeito de Imperatriz, a segunda mais importante cidade do Maranhão, e fez uma gestão desastrada, e nunca mais o PT conseguiu sobreviver  naquela cidade; da eleição de Olívio Dutra para prefeitura de Porto Alegre e depois para o governo do RGS;  de Tarso Genro governador do RGS.

No chamado Mensalão, com a crise que o PT viveu, o Tarso foi convidado para vir ser presidente do PT e imprimir um novo ritmo, mas só aguentou dez dias e saiu. Ele disse que o PT não tinha jeito, mesmo tendo recebido o apoio do Lula para fazer todas as transformações que precisavam ser feitas. Foi necessário que o Ricardo Berzoini assumisse, e foi um dos melhores presidentes que já tivemos.

Estou dizendo tudo isso pra concluir que se passamos por todos estes momentos difíceis é porque somos fortes e temos um propósito maior. Então, há esperança e não aceito agora determinadas tendências jogando toda a culpa em cima do chamado campo majoritário do PT, o pessoal da Articulação, que é a minha tendência, em cima da CNB, e ainda tentando culpar o PED – Processo de Eleição Direta –, que é o que há de mais democrático no partido.

O problema é que as exigências do PED não são cumpridas como deveriam ser: exige debates; exige que quem se filie ao PT passe por plenárias de convalidação. Eu defendo o PED. Eu quero, inclusive, aperfeiçoar o PED. Quero mais democracia interna no PT.

Não concordo com a proposta de algumas figuras do partido de que tem que haver um novo encontro ainda este ano para mudar a direção, caso contrário eles sairão do PT para formar outra agremiação. Com este tipo de intolerância querem efetivamente a reconstrução do PT? Não acredito.

Algumas pessoas saíram do PT como se fossem o supra sumo da moralidade, como a ex-senadora Heloisa Helena. Ai eu pergunto: a Heloisa Helena teria conseguido se eleger senadora se não tivesse acordo com os usineiros? Foi eleita quando fez acordo com Renan Calheiros.

Estou cansado de ataques sem propostas. Todos os que hoje estão criticando já foram mandatários, já foram maioria na direção do partido. Não acho, portanto, que tenham autoridade para falar em fazer um novo partido quando, na gestão deles, não conseguiram avanços no sentido de unificar e democratizar o PT. Mudar a direção não muda nada. Tem que apresentar algo novo.

O que precisamos neste momento? O PT tem que apresentar um novo projeto de lutas em prol da sociedade porque o atual se esgotou. Temos que reunir as cabeças pensantes do partido para apontar rumos e saídas, num novo momento para o país, num novo momento para as esquerdas. Temos que forjar uma nova direção para as esquerdas no sentido de atuar decisivamente na organização da sociedade na luta por seus direitos.

É a política no Brasil e no mundo que está em crise. Não só no PT. Temos que ter a humildade de reconhecer erros e avançar não apenas divergindo, mas compartilhando e unindo nossa experiência, nosso conhecimento em todos esses anos de luta contra a ditadura e pela radicalização da democracia no Brasil.

Costumo dizer que temos no PT a Nação Petista e o Estado Petista. O Estado Petista são os dirigentes, sejam da corrente A, B ou C; o estado carcomido, envelhecido, que não pensa no futuro, um dinossauro. Esse Estado Petista vive na briga do poder pelo poder.

Por outro lado, temos a Nação Petista, que são as pessoas simpatizantes do PT. Muitas vezes não são filiados ao PT. Saem às ruas com sua bandeira e seu grito por liberdade. Participam, agigantam as eleições e depois se recolhem e deixam o Estado Petista dominando.

Meu sonho se realizará quando a Nação Petista – viva e pulsante em todo o tempo – invadir o Estado Petista e quebrar as regras que não nos servem mais. Aí, sim, vamos mudar efetivamente a situação.

A partir de agora, espero que no lugar de petistas brigarem por um poder imaginário, que já não existe, tenham a dignidade e a humildade de não ficar cassando culpados. Que assumam todos a responsabilidade e digam: erramos.

Espero que estejamos dispostos a dar as mãos e corrigir nossos erros coletivamente, para que o PT sobreviva com uma nova visão de esquerda no Brasil, que vai apontar também na mesma direção de uma nova visão das esquerdas no mundo. Demonizar a política e a participação cidadã é o plano das elites em nível mundial. É contra isso que devemos lutar, unidos.

CHICO VIGILANTE
Dep. Distrital pelo PT/DF